quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Paulo Oliveira, responsável pelas Mesas Sectoriais de Comércio e Turismo na Câmara do Comércio e Indústria da Horta

"Há que encontrar formas de melhorar a oferta"

No assinalar do 115.º aniversário da CCIH fomos falar com Paulo Oliveira, presidente da Mesa Sectorial do Turismo da Câmara do Comércio e Indústria da Horta, e agora também responsável pelo Comércio, cuja Mesa Sectorial neste momento não existe. Dificuldades e desafios para ambos os sectores foram os temas abordados, num check-up a estas duas áreas estruturantes da economia faialense.

COMÉRCIO

“OS COMERCIANTES FAIALENSES TÊM DE ACTUALIZAR-SE O MAIS POSSÍVEL”

Quais as vantagens para os comerciantes locais de se congregarem na CCIH?
Paulo Oliveira - As vantagens são muitas. Se tiram partido delas é que já tenho dúvidas, porque lamentavelmente não os tenho visto nas Assembleias-Gerais e reuniões. Têm aparecido alguns, presença já de referência, mas grande parte não. Ou não têm tempo, ou as reuniões são a horas inconvenientes, ou estão desmotivados… Desconheço as razões, mas o que sei é que neste momento é muito difícil a mobilização. Aliás, sempre foi.

Acha que há falta de comunicação entre comerciantes e CCIH?
PO - Falta de comunicação não será, até porque é regular a CCIH enviar faxes, mensagens de telemóvel, etc., a informar dos eventos que acontecem. No entanto não há receptividade. Por exemplo recentemente houve um Seminário sobre Qualidade na Hotelaria e a sala estava cheia... de alunos da Escola Profissional. Contavam-se pelos dedos os empresários da restauração e hotelaria. São eventos que custam muito à CCIH, não só em termos financeiros, mas até no esforço de sensibilizar as entidades regionais para não concentrarem recursos apenas em S. Miguel e Terceira e virem à Horta. Às vezes esse esforço é inglório.
Os empresários não aparecem nos espaços de discussão e depois queixam-se das nossas sensibilidades não estarem reflectidas nas linhas de orientação regionais. Obviamente que, se não nos chegarmos à frente, elas não podem aparecer, e gera-se um círculo vicioso: as pessoas não contribuem porque não se sentem motivadas, mas também não se motivarão se não intervierem de modo a verem expostas as suas ideias. A CCIH é uma Associação, logo é imprescindível a colaboração dos sócios.

Quais são as dificuldades do comércio tradicional no Faial?
PO - São muitas, e resultam de culpas dos vários intervenientes, não só empresários mas também clientes.
Penso que há falta de sensibilidade para consumir o que é nosso. Enquanto que a nível nacional e europeu existem campanhas para se comprar o que é nosso, a nível regional não há esse culto. Os chamados “clientes de topo”, que são os que ganham mais, mas também viajam mais, preferem comprar fora.
Da parte dos empresários houve um esforço de actualização, com o URBCOM, em termos de obras nas lojas para torná-las mais atractivas. Em termos de produto, penso que há alguma falta de formação, nas áreas do atendimento (por exemplo é cada vez mais importante que os funcionários falem inglês), do vitrinismo, e mesmo de postura: o funcionário que está à porta à espera do cliente sem nada que fazer dá mau ambiente à loja.
Por outro lado, existe desconhecimento do cliente em relação a vários factores. Quando se diz que as coisas cá são mais caras, se virmos os chamados artigos de marca (pronto-a-vestir, calçado, vinhos, carros), esses são tabelados a nível nacional. Admito que no Faial existam menos possibilidades de escolha, como é natural… Mas os preços são de referência.
Também é necessário que se criem condições que atraiam clientes às zonas onde está instalado o comércio tradicional. Por exemplo neste momento em Ponta Delgada a iluminação de Natal já funciona, com investimentos muito grandes. Cá, até à data em que falamos, nem montada está, e é sempre a mesma.
Outro problema é a ausência de Parques de Estacionamento. O Plano de Urbanização prevê quatro ou cinco, mas o mais central é o que eventualmente se situará no actual Quartel de Bombeiros, caso este vague. Não existe nenhum na Rua Direita. Já dei algumas sugestões à autarquia de como se poderiam criar opções de estacionamento na rua principal. No Largo Duque D’Ávila, por exemplo, pode fazer-se um parque de um ou dois pisos, ideia que penso ser de um anterior arquitecto da CMH. Seria para 40 carros, não é muito, mas são menos esses que ficam sem lugar para estacionar. Outras soluções seriam em frente à residencial de São Francisco, por detrás do Mercado… Mesmo ao longo da Avenida Marginal há espaços que podem ser aproveitados. Depois, há que utilizar o mini-bus direccionado para os parques de estacionamento e não como urbana citadina para quem não tem carro. Quando o mini-bus foi implementado, era para servir os parques de estacionamento que seriam feitos nos extremos da cidade. Os parques nunca avançaram e continuamos com o mini-bus a funcionar como urbana.

Podemos concluir que a evolução do comércio tradicional requer iniciativa não só dos empresários mas também da autarquia e dos clientes?
PO - Sim. Tenho apelado ao diálogo entre CMH e CCIH, e aguardo com expectativa que as obras do Saneamento Básico, que vão virar a cidade do avesso, não sejam apenas abrir as estradas, colocar as tubagens e voltar a tapar. Há que aproveitar essa grande obra, que trará muito incómodo aos faialenses durante a execução, para trazer o máximo de benefícios à cidade: fechar ruas ao trânsito, alargar passeios, criar condições para a exploração de esplanadas (aqui também a nível financeiro, pois as taxas são muito caras) … Há muita coisa a ser feita, continuamos a aguardar mas este compasso de espera não beneficia ninguém.

Há falta de diálogo entre a CMH e a CCIH?
PO - Como ficou recentemente provado, há.

Está a falar da questão da Derrama?
PO -
Exactamente. Acho que é mais uma teimosia do que propriamente um esforço para contribuir. Há quem goste de falar em crise, há quem não goste, mas penso que toda a gente está empenhada em ultrapassar esta crise, ou dificuldade, ou o que lhe quiserem chamar, da melhor forma. E não custa nada dar sinais de boa vontade. Se a CMH está a dar um sinal de boa vontade, poderia fazê-lo de melhor forma.

O Faial, à semelhança do país, tem-se deparado com um fenómeno cada vez maior, que são as lojas orientais. Qual é o seu impacto?
PO - O impacto é grande. Defendo que todos têm os mesmos direitos, mas também as mesmas obrigações, e o que eu não vejo é as lojas orientais a cumprirem essas obrigações. São os horários de porta aberta que não são cumpridos, as regalias sociais, as próprias inspecções fiscais e económicas que se coíbem de exercer a sua acção como no comércio tradicional. As lojas devem ser encaradas da mesma forma, e pertencer a um ciclo de inspecções regulares, igual para todos.

Que desafios se põem aos empresários locais da área do comércio?
PO - Primeiro, têm de deixar de considerar-se entre eles concorrência, e passar a ser parceiros de negócios.
Têm de estar mais presentes na CCIH, e transmitir-lhe as suas preocupações.
Têm de se actualizar o melhor possível: análise diária dos caixas, ver onde se vende mais e menos, mudar mais vezes as montras... Tudo isso é importante para que o nosso comércio não fique parado no tempo. Penso que tem havido esforço de actualização, mas persistem alguns maus hábitos.
Temos de ter sempre em conta, no entanto, o tamanho do nosso mercado. Não podemos ter a mesma diversidade que em Lisboa. Há que ter, por exemplo, a sensibilização de não adquirir grandes quantidades da mesma peça de roupa.
Para evoluir o empresário precisa também da colaboração dos seus funcionários, e por vezes é difícil. Muitas vezes queremos manter os estabelecimentos abertos até mais tarde, ou fazer com que os funcionários assistam a formações, mas eles não têm disponibilidade. Há aqui uma inércia que não é só do empresário, mas também uma questão de mentalidade, e de identificação e solidariedade com a equipa. Tem de haver uma quebra progressiva de barreiras, de alguns empresários mas também de alguns funcionários e alguns clientes. Só assim conseguimos beneficiar a oferta que temos.
O empresário que decidiu apostar na ilha e não lá fora precisa de solidificar essa aposta todos os dias, ter o apoio dos funcionários, o carinho dos clientes, com a sua preferência…
Precisamos de uma postura de defesa do que é nosso; um certo clubismo, como aquilo que se vê no futebol, na política, que deveria estender-se à área comercial.
Temos de nos lembrar que o dinheiro que deixamos na ilha fica cá, e contribui para o desenvolvimento da nossa economia, desmultiplica-se, ou seja, todos beneficiamos.

Estamos a aproximar-nos do Natal, a época do ano mais importante para os comerciantes. A CCIH já tem uma estratégia para dinamizar o comércio tradicional este ano?
PO - Sim, e será divulgada na altura certa. O figurino será de um modo geral o mesmo. Tentámos alguma inovação, maior criatividade exterior. Queremos engalanar mais a rua. Vamos ver se conseguimos pôr as ideias de pé.

Os empresários faialenses receiam ter menos lucro este Natal, devido à crise?
PO - Penso que vamos ter menos vendas. A descida será maior para uns e menor para outros, e aí tudo depende um pouco da tal postura. O comerciante tem de fazer uma análise diária do que se passa na sua loja para saber o que pode melhorar. Essa análise não pode esperar meses. Se o Natal correr mal, acho que há lojas que não conseguirão sobreviver. O panorama não é famoso e todos se deviam unir para ultrapassar a situação.




TURISMO
“AÇORES NÃO TÊM POLÍTICA DE TRANSPORTES MARÍTIMOS CREDÍVEL”


Mudando o rumo da nossa conversa, esta crise afecta também o Turismo no Faial?
PO -
No Faial o Turismo está num patamar aceitável. Precisamos de mais hotéis, mais voos, mais turistas, mas nos últimos anos os números mantiveram-se, o que não acontece na Região, que neste momento está a perder 36 mil dormidas. À excepção de S. Miguel e Sta Maria (e também o Pico, mas aí há a condicionante das unidades hoteleiras estarem em obras), as dormidas nos Açores até têm crescido. Em S. Miguel as dormidas descem mas há mais turistas, o que é um contra censo: o que acontece é que há mais turistas a ir a S. Miguel mas ficam lá menos dias. Acho que os Açores caminham no trilho certo, que é o Turismo da Natureza, mas em S. Miguel o betão cresce, e não podemos promover verde e vender betão.
Neste momento está-se a desenvolver um plano de Marketing para o Turismo nos Açores, que a CCIH tem acompanhado. Penso que será uma boa forma de promover a Região.

O que falta ao Faial para dinamizar mais o seu Turismo?
PO -
Principalmente a organização do produto. Os empresários não estão organizados entre si: um vende o quarto, outro a refeição, outro o carro, mas não pacotes conjuntos. A divulgação do destino Horta parece ser quase proibida a nível regional. Fala-se sempre nos Açores, porque somos pequenos vamos promover o arquipélago num todo, mas há espaço para o destino Horta: estamos a quatro horas da Europa num destino seguro, sem terrorismo. Por outro lado, continuamos na Europa, com os benefícios que daí resultam. Um alemão cá sente-se em casa.
A organização do produto passa também por aumentar o tempo de estada do turista no Faial. Sobrevivemos do turista continental, mas este faz um “circuito açoriano estafante” (poucos dias em cada ilha), onde acaba por passar o tempo a viajar. Temos também de acabar com a ideia da “volta à ilha”. O turista chega ao Faial, dá a volta à ilha e pode ir-se embora. O Centro de Interpretação do Vulcão foi um pontapé de saída para acabar com isso: não se consegue dar a volta à ilha e visitar o Centro dentro dessa volta. Há que criar circuitos paralelos. Os taxistas têm de ser sensibilizados para, em vez de vender uma só “volta à ilha”, vender vários roteiros: a volta da cidade, com os miradouros, a Caldeira com a visita à fabrica de lacticínios e a uma exploração agrícola, o Centro de Interpretação com o Varadouro e a escola de artesanato… O turista pode ir ver as baleias, conciliando isso com a visita ao museu de Scrimshaw e um passeio na Marina e está um dia feito. Assim em vez de ficar dois dias fica uma semana.
Uma grande potencialidade a aproveitar é ligar o Turismo à pesca e à agricultura: a possibilidade do turista ir pescar, ou de se instalar numa quinta rural com galinhas, vacas, ou onde pode vindimar… Com isto valorizamos também os nossos produtos de qualidade do sector primário, que são únicos e nos valorizam.

O preço das passagens para os Açores é uma das grandes dificuldades para os empresários do turismo?
PO - O nosso problema são as acessibilidades. Neste momento o mercado é dominado pelo code-share SATA/TAP mas podíamos evoluir para um mercado semi-aberto, com algumas low-costs ou alguns voos charter como existe em S. Miguel e Terceira. Para isso é importantíssima a ampliação da pista do Aeroporto.
As acessibilidades passam não só pela tarifa, mas também pelos horários. Não nos serve ter um voo que sai de Lisboa as 08h00, porque não consegue fazer ligação com o resto da Europa. Interessa-nos ter um voo mais tarde, que possa trazer turistas que tenham chegado a Lisboa de manhã. O mesmo para a partida da Horta: é importante poder apanhar o voo para o seu país ainda no mesmo dia, pois o turista rejeita destinos onde tem de pernoitar na ida ou no regresso. No Inverno IATA, apenas com um voo diário, só nos interessa um horário central, ao meio-dia. No Verão, com dois voos diários, tal dificuldade não existe.
Temos também a questão dos transportes marítimos inter-ilhas. A Mesa do Turismo defende cinco ligações diárias fixas ao Pico ao longo de todo o ano (7h; 10h; 13h; 15h e 17h) e no Verão mais uma às 20h, e em Julho e Agosto outra às 00h, para que as pessoas possam ir à outra ilha jantar, divertir-se, e regressar à ilha de alojamento. Queremos também uma ligação diária a S. Jorge, que no Verão passasse a duas, reforçada com uma ao meio dia S.Roque/Velas.
A nível regional é o descalabro. Temos barcos novos que não sabemos quando começarão a operar, e a definição dos horários prejudica-nos, porque os turistas decidem onde vão passar as Férias de Verão em Dezembro, e nessa altura querem ter na mão, o bilhete de avião, o alojamento, os bilhetes de barco… Não conseguimos ter isso definido, porque os horários dos transportes marítimos são estabelecidos em cima da época. Este ano a Transmaçor teve cinco horários diferentes no Verão. Isto não funciona, tem de haver carreiras estruturantes, mantidas ao longo do ano.
Somos uma Região insular sem política de transportes marítimos credível… Estamos a aproveitar mal a nossa maior potencialidade: o Mar.
Temos também de aproveitar ao máximo a componente ambiental. Temos já o Centro de Interpretação e um bom Jardim Botânico, mas temos também um aquário Virtual que já devia estar pronto há um ano, agora é que se vão fazer os acessos à Fábrica da Baleia, o Morro de Castelo Branco está esquecido, a Caldeira não tem visto investimento… Temos fundamentalmente ecologia e ambiente para vender, e como tal, precisamos que rapidamente se façam mais investimentos estruturantes na área. O Campo de Golfe é um exemplo.

Preocupa-o esta inércia relativamente à execução do Campo de Golfe?
PO - Sim é uma obra importante para aumentar a oferta e combater a sazonalidade, que é o nosso calcanhar de Aquiles. As unidades faialenses estão esgotadas durante 6 semana em Julho e Agosto, mas no resto do tempo não é assim.

Quer no Comércio, quer no Turismo, o que recomenda?
PO – Temos, todos, que contribuir para aumentar e diversificar a oferta.
Comparando, S. Miguel tem o Verão e o Santo Cristo em Maio. A Terceira tem o Verão e as Sanjoaninas em Junho. E o Faial, tem o Verão e a Semana do Mar em Agosto. Enquanto as outras ilhas têm 3 a 4 meses de ocupação plena, a Horta tem escassas 6 semanas.
Há que encontrar formas de melhorar a oferta, e para isso tem de haver diálogo no Triângulo, mas, e acima de tudo, no Faial, com empresários, trabalhadores, clientes, políticos... Ninguém poderá ficar marginalizado deste processo, se quisermos - e penso que todos queremos - um futuro melhor para todo.
A tarefa que nos espera é gigantesca, mas uma coisa é certa: só beneficiará quem se esforçar!

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