Chegou ao fim no passado domingo a quinta edição do Faial Filmes Fest – Festival de Curtas das Ilhas, com Arena, de João Salaviza, a sagrar-se o grande vencedor, ao levar para casa o prémio de melhor filme.
Luís Pereira, presidente do Cineclube da Horta e director do FFF, faz um balanço de sucesso de mais esta edição e sobe a fasquia para 2010: “o próximo ano será, em termos de competição, bastante mais exigente, tanto para a secção Açores, como para secção geral”, garante.
O presidente do Cineclube faialense mostra-se satisfeito com a qualidade do programa deste Festival, segundo ele “com um conteúdo verdadeiramente cinematográfico e muito rico, tanto em qualidade como em diversidade, que foi apreciado pelo público”. “Foi muito gratificante ver as salas, se não cheias, pelo menos muito compostas, para as sessões especiais e para as sessões de competição, e ver o envolvimento do público na festa do cinema, que se fez no Cine Teatro Faialense mas também nos espaços de convívio que se geraram em torno da música, nas noites do FFF'09”, garante.
O Cineclube organizador e o público não foram os únicos a atestar a qualidade do Festival. Também os realizadores que passaram pelo Faial não pouparam elogios à iniciativa, e esse feedback é, para Luís Pereira, motivo de orgulho. “Pensamos que levam daqui memórias que não esquecerão e que irão transmitir a outros, o que só favorece o Faial Filmes Fest, e também a nossa ilha e os Açores”. Fascinado com as nuvens do Pico, Paulo Rocha, o conceituado realizador Paulo Rocha mostrou-se interessado em filmar alguns dos planos do próximo filme no Faial e João Salaviza manifestou vontade de voltar a esta ilha, e a participar no FFF.
Luís Pereira destaca também outras valências que constituíram este Festival, também elas bem sucedidas: “o atelier-escola "Como se faz um Filme", ministrado por Henrique Espírito Santo, que envolveu mais de 300 crianças do ensino básico, a oficina de cinema e música "Sem Palavras", ministrada pelo Fausto André e pelo Nuno Costa, que resultou numa magnífica apresentação ao vivo, no Cine Teatro Faialense, e ainda o programa que decorreu na Escola Secundária Manuel de Arriaga, para todos os alunos da escola”, exemplifica.
2009 ficou marcado pelo número recorde de filmes a concurso. Instado a pronunciar-se sobre a dificuldade na selecção dos vencedores, Luís Pereira lembra que “a atribuição dos prémios é uma decisão do Júri do Festival e a organização não interfere nessa matéria”. No entanto, em relação à escolha do Júri – essa sim da responsabilidade da organização – destaca o cuidado do Cineclube em “escolher pessoas ligadas ao meio e sabedoras, desde dirigentes cineclubistas a produtores e programadores culturais, passando por realizadores e responsáveis por sectores governamentais ligados ao cinema”. Apesar disso, a escolha dos vencedores não terá sido tarefa fácil, como dá a entender Luís: “algumas das decisões do Júri não forma absolutamente pacíficas ou fáceis, mas é também nessa "polémica" que se consegue determinar o mínimo denominador comum que torna possível encontrar uma solução de consenso”, explica.
Outra novidade que 2009 trouxe ao FFF foi a inclusão de filmes de outras ilhas da Macaronésia. Esta evolução gradual também na área de abrangência do Festival deixa no ar a hipótese deste se tornar internacional, até porque Luís Pereira já referiu em outras ocasiões que estão reunidas condições para que, com os devidos apoios, assim seja.
O responsável reitera a existência dessa possibilidade, no entanto entende que deve ser um “passo muito reflectido, para não se perder a identidade do Festival”. “Não nos interessa ter ‘mais um festival de cinema’ ou um festival que seja mais uma ‘feira de vaidades’ e um ‘produto de promoção turística’ do que um espaço de promoção, fruição e divulgação do cinema de qualidade. É este o caminho que queremos seguir, com conteúdo e com coerência, e vamos trabalhar nesse sentido, com as competências que já temos e as novas aprendizagens que vamos fazendo ao longo das edições, para criar o maior e mais carismático festival de cinema dos Açores”, garante.
“É uma honra receber o prémio das mãos deste animal do cinema”
Foi com estas palavras que o jovem prodígio João Salaviza recebeu das mãos do veterano Paulo Rocha o troféu destinado à melhor ficção do FFF 2009, atribuída a Arena. Num verdadeiro encontro de gerações, o palco do Festival juntou uma lenda viva do cinema português a um dos mais jovens e talentosos realizadores lusos da actualidade.
Salaviza foi, de resto, o grande vencedor do FFF, com o seu Arena a arrecadar três estatuetas, entre as quais a de melhor filme do Festival. A qualidade de Arena já tinha, de resto, sido reconhecida pelo júri do Festival de Cannes, que lhe atribuiu a Palma de Ouro.
Na competição regional, o grande vencedor foi o documentário A Natureza e o Engenho, de André Laranjinha. Já Insula, de Filipe Gomes, foi considerado pelo júri o melhor filme faialense a concurso.
Partilhar os filmes com o público “pode ser bastante assustador”
Quem o diz é Filipe Gomes, realizador da curta-metragem Insula, considerada pelo júri do FFF o melhor filme faialense do Festival.
Com 28 anos, Filipe nasceu no Faial, tendo vivido no Pico até aos dois anos de idade. A ligação aos Açores nunca se dissipou, fortalecida por visitas regulares e, mais tarde, por um período de quatro anos em que viveu no Pico. “Essa vivência particular de quatro anos teve importância não só na minha relação com a ilha, com os Açores, mas também no próprio desenvolvimento da personalidade”, explica. Actualmente vive em Palmela, é baixo no Ensemble Voct, um grupo vocal a capella, e está a iniciar um projecto de artesanato relacionado com os Açores.
Insula foi a primeira experiência de realização que Filipe partilhou com o público. “Estou a aventurar-me, de forma amadora e exploratória, pela realização de curtas, sendo os festivais o único local onde essas curtas poderão ser exibidas e avaliadas. Isto exceptuando o poderoso meio de divulgação que é a Internet, o qual pode provocar sempre mais receios na publicação de uma obra original na íntegra”, explica. Para Filipe, “a participação é essencialmente um modo de partilha pública da nossa criação, algo que pode ser bastante assustador, pois, por mais autocríticos que sejamos, jamais poderemos vê-la como os outros”.
Quando soube da premiação, confessa que ficou surpreendido, já que o seu objectivo era apenas conseguir ser seleccionado de entre os mais de cem filmes a concurso neste festival.
“Esta é a segunda vez que participo num festival e, como amador que sou, é minha intenção testar o potencial que possa ter na realização e criação em cinema. Cada resultado é um indicador e forma de avaliação desse potencial ou inexistência do mesmo. Creio que a pequena "vitória", se assim lhe quisermos chamar, no Faial Filmes Fest, é um indicador positivo que não poderei deixar de ter em conta em escolhas e novos caminhos a percorrer”, entende.
Antes do FFF, Insula concorreu no Festival de Microfilmes de Lisboa, em 2007. Filipe explica-nos que, nesse festival, a curta não poderia ser superior a três minutos. Sendo assim, aventurou-se a experimentar, sem uma ideia inicial muito elaborada: “a ideia original era misturar imagens de duas ‘ilhas’. A ilha natural, neste caso o Pico, e a ilha humana, que seria Lisboa, criando um contraste que faz parte da vida de muitos açorianos a residir nessa cidade. Devido à minha ingenuidade tecnológica, às limitações de equipamento e à falta de imagens da cidade, acabei por alterar a ideia e incluir apenas as cenas filmadas nos Açores. O acrescento do texto inicial, em português antigo, retirado do Arquivo dos Açores, acabou por dar uma perspectiva mais histórica e curiosa e ser uma forma de assinalar os 500 anos da escrita dessa descrição da ilha do Pico”, explica.
Um dos objectivos de Filipe era filmar o movimento das nuvens em volta da montanha do Pico (as mesmas nuvens que encantaram o realizador Paulo Rocha) e ver qual o resultado final. “Para isso fiz capturas de seis frames, com intervalo de três segundos entre cada. Na edição, em algumas cenas de nuvens, ainda acrescentei maior velocidade, para aumentar o efeito de movimento rápido”, descreve. “Sempre me atraiu esse tipo de efeito, muito comum em alguns documentários, em que podemos ver o verdadeiro movimento do mundo, imperceptível aos nossos olhos”.
Insula constituiu-se, assim, como uma forma de mostrar uma visão alternativa da ilha e montanha do Pico, local que pelo qual Filipe diz sentir-se desde sempre fascinado.
No entanto, no que toca a cinema, a animação é o género de eleição deste realizador. “De momento estou a realizar uma curta em 2D digital. A animação é um mundo que não parece ter limites naquilo que se possa criar, mas também exige grande paciência e uma visão do objectivo final. Essa parece ser, na minha opinião, a única desvantagem em relação a uma ficção, documentário ou o que seja, que utiliza aquilo que já existe em nosso redor e não tem necessidade de criar um mundo de raiz”, explica.
FOTO: CARLOS PINHEIRO
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